Os alunos da Casa da Ciência percebem a importância das anotações para recordar, contar aos outros, organizar seu pensamento, relacionar conceitos e, por fim, ter conteúdos inéditos que não se encontram nos livros e na internet.

O caderno de anotações faz parte da estratégia da Casa. É o companheiro inseparável dos alunos durante as atividades, mas muitas vezes passa despercebido. Quando se inscrevem no Adote um Cientista, perguntam ao telefone o que trazer e a resposta é: um caderno de anotações e um lápis. A equipe já antecipa que precisam anotar. Ao chegarem, os alunos se deparam com um anfiteatro grande e confortável, uma equipe atenta e pesquisadores que falam “coisas complicadas”. Chegam sem saber direito o que anotar e, muitas vezes, começam copiando o que vêem, o que está escrito nos slides, por exemplo. Dificilmente compreendem tudo o que está sendo falado, mas começam a praticar a anotação. Com o passar do tempo, neste ambiente aberto a reflexões e manifestações diversas – suas, de seus colegas e dos pesquisadores -, constroem o conhecimento. E assim, os conteúdos dos cadernos vão mudando conforme aprendem a relacionar conceitos, aprendem a perguntar e anotar.

Quando cheguei aqui, não me dava aquele toque que eu tinha que anotar. Porque na escola era aquele negócio de você copiar o que está na lousa e não o que o professor está falando. Depois que eu fui pegando esse negocio de anotar. (André, 2010)

Um aluno da Casa, do ensino fundamental, participou em 2014 do Curso de Verão do Hemocentro, voltado a alunos de graduação na área da biologia de todo Brasil. Alguns alunos da Casa tiveram a oportunidade de participar. Durante uma palestra, um dos participantes, graduando,  perguntou se ele era jornalista por anotar tanto. Ele respondeu que não, e disse: “Onde você vai encontrar o que ele (pesquisasdor) está falando?”.

Aprendem como e o que anotar, uma habilidade que caminha junto com o aprender a estudar. Relatam que ajuda a memorizar e fazer a associação de ideias.

E você sabe que vai esquecer. Não tem jeito de só copiar. Você tem que tomar nota. Tem gente que faz os dois: copia e anota. Às vezes o que ele (pesquisador) fala eu anoto o que eu entendi. Normalmente quando você vai anotando está entendendo. O livro é mais complicado e no caderno você escreve do seu jeito e e depois você vai para o livro.(Daniele, 2010)

Eu passei a anotar depois daqui mesmo. Pra mim, (antes) caderno era para fazer lição. A professora passava, você copiava, respondia. Eu começava a anotar porque o que eu aprendia aqui era algo totalmente diferente do meu mundo. Eu sempre fiz rabisqueira e depois chegava em casa e passava a limpo. Eu me sinto mais segura com caderno de anotações. O processo de anotar ajuda a memorizar e a juntar, associar as ideias, o que o professor ta falando com o que você compreendeu. E depois é bom por que nem tudo fica guardado na cabeça. Você retorna a ele, o que você anotou, os dados, depois comparar também, que eu geralmente faço isso. (Daianne, 2010)

Em 2015, no primeiro dia do Adote um Cientista, a Casa convidou um ex-aluno, Lucas Kava (participante da Casa em 2011-2012) para conversar com os jovens ingressantes. Lucas tinha acabado de passar no vestibular em primeiro lugar e iria iniciar o curso de Economia na FEA-USP. Motivos de sobra para comemorações e alegrias, Lucas surpreendeu quando mostrou seu caderno de anotações.

Esse aqui é o meu caderninho daquela época, eu ainda tenho ele. E ele faz parte da minha história. Mesmo que eu tenha aprendido muita coisa aqui na área da biologia e hoje eu estou ingressando em um curso de ciências econômicas, que não tem muito de biologia lá. Eu queria ressaltar para vocês a importância de fazer anotação. Tudo que eu aprendi aqui na Casa eu consegui usar em todos os momentos da minha vida depois que eu aprendi. Durante o cursinho, durante o preparo pro vestibular, eu tinha maiores conhecimentos sobre, por exemplo, diabetes, do que meus colegas de classe. E isso é muito importante.  (Lucas, 2016)

Deixam de ouvir e passam a escutar o que esta sendo explicado, a ponto de selecionar o conteúdo e fazer a anotação que achar importante. Uma habilidade que se desenvolve com o aumento de compreensão e da relação dos conceitos. O exercício de anotar evolui com o de pensar. Isso é o que notamos nos alunos. A abertura dada pelo ambiente na Casa, no “estou te ouvindo”, provoca um estar presente de corpo e mente. Esta sinceridade permite que todos aprendam, inclusive os pesquisadores, nas respostas inesperadas, na forma de trabalhar. E os alunos, na sua construção particular, mas intensamente partilhada com seus colegas, está na atenção, no olhar, ver e ouvir seus colegas. E depois levantar a mão e dizer o que pensa, fazer uma pergunta, e se manifestar. A participação ativa de estar no mundo e fazê-lo, fazer-se, construir-se, causa uma autonomia e liberdade.

Texto por Flavia Fulukava