Em conversas sobre a Casa da Ciência do Hemocentro de Ribeirão Preto, é comum a manifestação de  curiosidades sobre os alunos de escolas básicas que frequentam o programa Adote um Cientista, que acontece desde 2005. Surgem perguntas recorrentes, tais como: “Quem são os alunos, por que e como conseguem frequentar o Hemocentro? Eles gostam? O que aprendem no Adote?” Também querem muito saber: “Quais são suas mudanças ao frequentar o Adote? Pessoalmente e em relação às suas escolas, fazem diferença? E depois que saem, continuam estudando? O que dizem seus professores, colegas e pais?”

O contato pessoal – além do virtual que também é frequente – da equipe da Casa com os alunos tem sido durante  às quintas (14:30 às 17h). Durante este período, os alunos têm atividades com pesquisadores – palestras e grupos temáticos no Pequeno Cientista -, as quais são muito valorizadas por todos, também pelos professores participantes que os acompanham. O tempo reservado à estes encontros semanais  torna-se curto quando comparado à disponibilidade de ambas as partes para aprender e também para ensinar. Por isso, a equipe considera conflitante roubar tempo dos alunos para ouvir suas opiniões e depoimentos.

Análises de alguns questionários passados no decorrer da história da Casa revelaram algumas informações que  surpreenderam a equipe. Afirmações recorrentes, como:  “não aprendemos muito, mas aprendemos a estudar”; “vindo ao Adote, passamos a dar mais valor às aulas, principalmente  às falas de professores”; “gostamos de contar o que aprendemos para colegas, em casa, para irmãos mais novos, assim percebemos o que sabemos”.

Apresentação de 1 minuto para cada  aluno

Recentemente, em uma quinta, dia 30 de maio, na ausência de orientadores, tivemos a oportunidade de reunir 3 grupos do Pequeno e ouvir seus comentários. Os 24 alunos presentes, 3 que já haviam participado do Adote em  anos anteriores e 21 que ingressaram em março deste ano, reunidos na sala verde do Hemocentro, foram convidados a dar seu depoimento em um minuto, como acontece em entrevistas de TV.

Os 3 Grupos do Pequeno cientista presentes eram:

  • As Pequenas formas dos insetos e suas interações com o nosso planeta
  • Desvendando os mistérios do teste de paternidade
  • Importância da educação e motivação na promoção da saúde bucal de escolares da região de Ribeirão Preto

Como sugestão para uma fala livre de 1 minuto, citando exemplos de atividades do grupo, foram dadas as seguintes questões norteadoras:

  • O que mudou no seu comportamento após o Pequeno?
  • O que costuma contar para as pessoas sobre o Pequeno?
  • O que mudou em relação à escola?
  • Comente as suas dificuldades, críticas e sugestões.
  • O que esperava do Pequeno? E agora, o que espera?

Quando solicitamos alunos voluntários para redigir/reportar as falas, nenhum se apresentou. Após insistência e promessa de que é um aprendizado importante, poucos se habilitaram e foram os mais atentos.

Analisando os registros, o que se percebe de coincidência, quase unanimidade, são comentários como: os grupinhos despertaram a curiosidade dos alunos; apesar de ser muito difícil, complexo para entender; os conteúdos parecem estar todos interligados, têm relações. Dentro do primeiro comentário identificamos falas como “Não entendi como DNA é tão complexo e parecia simples. Para extrair precisa de muitos passos e substâncias”, “gosto muito de prática, precisa ter mais” e “tinha nojo dos insetos e passei a gostar, especialmente de joaninhas, passei a ter curiosidade”, o que nos indica um aumento de interesse e desconstrução de certos conhecimentos.

Já no segundo comentário, sobre a complexidade dos temas, passagens como “não entendi eletroforese”, “tive muita dificuldade em entender polimorfismo” e “fiquei com dúvidas na palestra de glutamato” estão muito presentes nos registros. A percepção da dificuldade da área do conhecimento em que estão inseridos, nos grupos do Pequeno cientista e também nas palestras, é crucial para quebrar as linhas superficiais às quais são expostos, desconstruindo a ideia de que apenas aprender os conteúdos e nomenclaturas já lhes dá domínio do conhecimento.

No terceiro e último comentário presente mais de uma vez nos relatos dos alunos, a noção de conexão entre conteúdos e áreas aparece nas vivências dos grupos de orientação. Compreender que a ciência integra seus diversos conhecimentos, e não é feita de forma isolada e solitária, é um dos aspectos mais importantes da iniciação científica promovida pelas orientações.

Neste sentido, um momento da conversa com os alunos, na tarde daquela quinta-feira, merece destaque e pode ser considerado uma síntese do que significa frequentar o Adote um cientista, pela primeira vez. Um aluno, ao se manifestar, fez uma representação através de encaixes com as mãos para demonstrar que para ele – e também para outros alunos que concordaram – a Ciência passou a significar relações que têm sempre “algo a mais”.  Completado por outro aluno que disse ter percebido que “nunca acaba/não tem fim”, “são partes que sempre se ligam”. Com estas manifestações, pareciam estar sintetizando que são diferentes níveis de organizações biológicas “ditados” pela natureza. 

Alguns outros relatos dos alunos evidenciaram que depois que começaram vir ao Adote passaram a ficar mais interessados nas aulas em suas escolas regulares e no que o professor diz, melhoraram como alunos. Fatos estes exemplificados nas seguintes falas: ”achava que era boa aluna, mas aqui percebi que tinha que mudar”, “tomo nota e às vezes olho quando conto para alguém, costumo contar para colegas, irmãos”, “comecei a gostar mais da escola, levo o conhecimento aprendido”, “comecei a observar mais o mundo, e a deixar o celular de lado”.

Texto: Bárbara Benati, Marisa Barbieri e Ricardo Marques.